Agi e Santa Cruz Advocacia

Responsabilidade pessoal do administrador em débitos fiscais

Sabe-se que existe um véu, chamado de personalidade jurídica, que protege o patrimônio dos sócios de responsabilidades provenientes da sociedade limitada, de forma que apenas em situações excepcionais, nas quais exista abuso da personalidade jurídica, eventuais débitos contraídos pela sociedade podem recair sobre os bens dos sócios ou administradores . O que busca o ordenamento é fornecer segurança jurídica para garantir condições de competitividade no mercado, em consonância com os preceitos da ordem econômica.

O Código Tributário Nacional (CTN) é datado de 1965, sendo anterior ao atual Código Civil e ao Código de Defesa do Consumidor, os quais passaram a prever expressamente as teorias de desconsideração da personalidade jurídica. Assim, apesar de ter cara, forma, e jeito de Desconsideração da Personalidade Jurídica, a previsão trazida no artigo 135 do CTN não se trata de IDPJ propriamente dito, mas de inclusão de administrador na condição de coobrigado. Portanto, ainda que não esteja no quadro societário, mas conste como administrador, é possível o redirecionamento das obrigações fiscais para sua pessoa.

Neste sentido, é possível que os bens do administrador sofram constrições decorrentes de débitos fiscais contraídos pela sociedade, nas hipóteses de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato ou estatuto, o que pode resultar na responsabilidade pessoal dos diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito privado.

Para se resguardar de eventual inclusão em Execução Fiscal contra sua pessoa, na forma do artigo 135 do Código Tributário Nacional (CTN), deve o administrador agir estritamente em conformidade com a Lei e o Contrato/Estatuto Social, evitando confusão patrimonial e atos que possam ser considerados como ilícitos, em sentido amplo.  O requisito subjetivo exigido pela jurisprudência  é a existência de Poderes de Gestão, o que resulta no fato de que a pessoa que seja administradora, mas não exerça efetivamente Poder de Gestão na empresa, não pode ser responsabilizada pelos débitos fiscais.

Por conseguinte, ainda que ostente a condição de administrador, o contribuinte não pode ser responsabilizado caso a autoridade fazendária não demonstre a existência de poder de gerência e administração na empresa. Destaque-se que constitui ônus do Fisco a individualização da conduta fraudulenta praticado pelo coobrigado que permita sua responsabilização pessoal, bem como a prova deve ser feita em relação a cada coobrigado, não cabendo a extensão genérica de prova em relação a um dos administradores para os demais.

Consigne-se que a jurisprudência do CARF[1] entende pela necessidade do elemento volitivo, ou seja, impõem-se a prova de que a conduta praticada com infração ou excesso de poderes foi dolosa. Por esta razão, não cabe à Fazenda a tentativa de responsabilização do administrador com base apenas na existência de seu nome constar no Conselho de Administração, sem que seja demonstrado cabalmente o ânimo específico de infração à lei, ou de agir com excesso de poderes.

Para minimizar o risco de responsabilização pessoal por débitos fiscais, é mister que os administradores adotem práticas preventivas. Isso inclui a documentação clara de seus atos de gestão, como decisões importantes registradas formalmente em atas e resoluções, além da revisão periódica de contratos sociais e estatutos, garantindo a conformidade com a legislação vigente. A separação entre o patrimônio pessoal e empresarial também é crucial, evitando a confusão patrimonial que pode justificar a desconsideração da personalidade jurídica. Além disso, o acompanhamento contínuo das obrigações fiscais da empresa, por meio de auditorias internas e consultoria tributária, reforça o cumprimento das normas e evita possíveis sanções.

Conclui-se, assim, que apesar das amplas prerrogativas concedidas à Fazenda na persecução do crédito fiscal em juízo, incluindo a responsabilização pessoal dos administradores, essa prerrogativa encontra limites claros na legislação. É imprescindível que a autoridade fazendária atue conforme esses limites e que os administradores, por sua vez, adotem uma postura preventiva, evitando a prática de atos ilícitos ou com excesso de poderes, a fim de mitigar riscos de responsabilização pessoal.


[1] 1ª CSRF, Acórdão nº 9101-003.212, Relatora Cons. Adriana Gomes Rêgo, julgado em 08/11/2017.